Medida Provisória determina que softwares no governo usem licenças de código-aberto

Está no Diário Oficial da União de Hoje a Medida Provisória n.º 983, que trata de assinaturas digitais e do licenciamento de software na administração pública.

http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-983-de-16-de-junho-de-2020-261925303

Em especial para o assunto do software livre, destaca-se o art. 8º:

CAPÍTULO IV

DOS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO E DE COMUNICAÇÃO DOS ENTES PÚBLICOS

Licenciamento dos sistemas de informação e de comunicação

Art. 8º Os sistemas de informação e de comunicação desenvolvidos ou cujo desenvolvimento seja contratado por órgãos e entidades da administração direta, autárquica e fundacional dos Poderes e órgãos constitucionalmente autônomos dos entes federativos são regidos por licença de código-aberto, permitida a sua utilização, cópia, alteração e distribuição sem restrições por todos os órgãos e entidades abrangidos por este artigo.

§ 1º O disposto no caput aplica-se, inclusive, aos sistemas de informação e de comunicação em operação na data de entrada em vigor desta Medida Provisória.

§ 2º Não estão sujeitos ao disposto neste artigo:

I - os sistemas de informação e de comunicação cujo código fonte possua restrição de acesso à informação, nos termos do disposto no Capítulo IV da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011;

II - os dados armazenados pelos sistemas de informação e de comunicação;

III - os componentes de propriedade de terceiros; e

IV - os contratos de desenvolvimento de sistemas de informação e de comunicação que tenham sido firmados com terceiros antes da data de entrada em vigor desta Medida Provisória e que contenham cláusula de propriedade intelectual divergente do disposto no caput .

A medida já está valendo para todos os poderes e esferas da administração. Sem dúvida é um grande avanço em relação à situação anterior.

A dúvida ficou se a expressão “permitida a sua utilização, cópia, alteração e distribuição sem restrições por todos os órgãos e entidades abrangidos por este artigo” abrange as 4 liberdades do software para todo mundo, incluindo aí os entes privados, ou se essas permissões valem apenas para os órgãos da administração pública.

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Agora o software livre na administração pública é lei!

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.063-de-23-de-setembro-de-2020-279185931

CAPÍTULO V

DOS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO E DE COMUNICAÇÃO DOS ENTES PÚBLICOS

Art. 16. Os sistemas de informação e de comunicação desenvolvidos exclusivamente por órgãos e entidades da administração direta, autárquica e fundacional dos Poderes e órgãos constitucionalmente autônomos dos entes federativos são regidos por licença de código aberto, permitida a sua utilização, cópia, alteração e distribuição sem restrições por todos os órgãos e entidades abrangidos por este artigo.

§ 1º O disposto no caput deste artigo aplica-se, inclusive, aos sistemas de informação e de comunicação em operação na data de entrada em vigor desta Lei.

§ 2º Não estão sujeitos ao disposto neste artigo:

I - os sistemas de informação e de comunicação cujo código-fonte possua restrição de acesso à informação, nos termos do Capítulo IV da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011;

II - os dados armazenados pelos sistemas de informação e de comunicação;

III - os componentes de propriedade de terceiros; e

IV - os contratos de desenvolvimento de sistemas de informação e de comunicação que tenham sido firmados com terceiros antes da data de entrada em vigor desta Lei e que contenham cláusula de propriedade intelectual divergente do disposto no caput deste artigo.

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Aa alteração da redação do art. 8º da Medida Provisória para o art. 16 da Lei é bastante relevante. Vejam as diferenças:

MPV 983

Art. 8º Os sistemas de informação e de comunicação desenvolvidos ou cujo desenvolvimento seja contratado por órgãos e entidades

Lei 14.063

Art. 16. Os sistemas de informação e de comunicação desenvolvidos exclusivamente por órgãos e entidades

Entendo que ela enfraquece, sim o escopo, restringindo-o apenas ao desenvolvimento interno pela administração pública e sem a participação de terceiros.

Por exemplo, ficam de fora:

  • os softwares desenvolvidos por empresas privadas, mediante contrato de desenvolvimento de software com a administração pública e pagos com recursos públicos;
  • os modelos de desenvolvimento híbridos / colaborativos, em que participam tanto servidores e empregados públicos, quanto de empresas privadas, em um ecossistema de software livre em que todos compartilham os benefícios – como é no software público

Esses casos estavam dentro do escopo da Medida Provisória e ficaram de fora do escopo da Lei, embora a licença do software livre e do software público continuem valendo, então a Lei não consegue atrapalhá-lo por deixá-lo de fora do escopo.

Vejo que inseriram uma brecha para que essa lei vire letra morta, pelo menos no que se refere a esse artigo. Se o órgão público não quer cumprir a cláusula, basta ele contratar uma empresa privada para acrescentar uma linha de código ao sistema de informação ou de comunicação. Pronto, o sistema não é mais “exclusivamente” desenvolvido por órgão público, não precisa mais abrir o código.

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@herrmann continuando com essa discussão sobre quais sistemas de informação estariam no escopo do art. 16, percebi que o inciso IV, § 2º fala que

Art. 16. […]
§ 2º Não estão sujeitos ao disposto neste artigo:

[…]

IV - os contratos de desenvolvimento de sistemas de informação e de comunicação que tenham sido firmados com terceiros antes da data de entrada em vigor desta Lei e que contenham cláusula de propriedade intelectual divergente do disposto no caput deste artigo.

Será que isso seria argumento suficiente para falar que contratos de desenvolvimento que não tenham cláusula de propriedade intelectual divergente do disposto no art. 16 devem ser regidos por licença de código aberto?

Aqui em Minas Gerais (Governo Estadual) não tenho visto movimentação sobre essa lei. Você viu algo relevante no Governo Federal?

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Eu creio que as disposições da lei se apliquem a esses contratos, sim.

Quanto à abertura do código, a lei apresenta várias definições no art. 3º, mas não define o que considera como sendo código aberto. A definição comum mais aceita provavelmente é a da Open Source Initiative, que é incompatível com a redação do art. 16.

Art. 16. Os sistemas de informação e de comunicação desenvolvidos exclusivamente por órgãos e entidades da administração direta, autárquica e fundacional dos Poderes e órgãos constitucionalmente autônomos dos entes federativos são regidos por licença de código aberto, permitida a sua utilização, cópia, alteração e distribuição sem restrições por todos os órgãos e entidades abrangidos por este artigo.

Há diversas formas de se interpretar esse artigo.

Uma interpretação mais ampla diria que, na falta de uma definição na lei do que é código aberto, código aberto deve ser entendido da forma como é amplamente entendido na sociedade, sendo a definição da OSI a mais conhecida e reconhecida. Assim, as permissões que são dadas aos órgãos públicos são apenas exemplificativas. Por ser aberto, o código pode ser usado por toda a sociedade.

Uma interpretação mais restritiva diria que, na falta de definição na lei do que é código aberto, considera-se as permissões do art. 16 como sendo a própria definição de código aberto. Assim, as permissões dadas aos órgãos públicos seriam exaustivas, isto é, o código não pode ser usado por outras partes que não sejam as ali citadas.

Havia um destaque no projeto de lei que pretendia elucidar essa questão, deixando o código aberto para uso de toda a sociedade, mas ele não foi aprovado.

Como a lei é recente, não há como prever de que forma o poder judiciário irá interpretar esse artigo da lei. Tampouco vi movimentação no sentido de abertura de código para atender a essa lei.